Foi publicada uma
belíssima reportagem na revista “Piauí” sobre o Sumo no Brasil,
focando principalmente no trabalho do atual técnico da seleção
brasileira de Sumô, Giuliano Tussato, e nas dificuldades dos
lutadores brasileiros. Leia o texto na íntegra AQUI.
Ocorre que percebo que
o texto merece ser ora completado ora explicado, para que o leitor
possa ter uma melhor assimilação e entendimento da realidade do
Sumo no Brasil. Assim, tomo a liberdade de fazer os comentários
abaixo:
1 - “(...) comenta o
pai do garoto que acaba de entrar pela primeira vez na vida em um
dojô.” e “O sumô tem um objetivo simples: empurrar o
adversário para fora do círculo demarcado no dojôou fazer
com que encoste no chão qualquer parte do corpo que não seja a sola
dos pés.”
Essa é fácil,
heim... “Dojo” (道場), que
literalmente significa algo como “local do caminho”, é o local
onde o caminho do aperfeiçoamento físico, psíquico, moral, etc. é
desenvolvido através da arte marcial. Ou seja, é o nome dado ao
local onde se praticam todas as artes marciais japonesas, com exceção
do Sumo.
No nosso esporte, o
termo correto é “Dohyo” (土俵)
que é o nome dado à arena de terra utilizada especificamente para a
prática desse esporte milenar.
2 - “Juba tentará
levar os dezesseis brasileiros classificados a uma posição digna”
Acredito que nossos
atletas estarão em condição muito digna só em conseguir
participar do Campeonato Mundial de Sumo 2014. Explico: dos quinze
atletas, apenas dois tem apoio de entidades públicas ou privadas. O
restante está batalhando muito para levantar os recursos que
garantiriam a participação nesta competição.
Infelizmente esses
lutadores passam dificuldades diárias que os impedem de treinar
adequadamente. Gastam os finais de semana promovendo eventos que
levantem um troco. Caio, de Guaianazes, vende quentinhas de feijoada;
Dorotéia, em Capão Bonito, rifou um leitão; Luciana vendeu rifas
de porta em porta na cidade de Suzano; Wagner terminou de pagar as
passagens para Cali neste mês, pois havia parcelado em 10 vezes no
cartão; Ricardo vendeu cookies aos seus colegas de trabalho; eu
mesmo vendi muitas rifas e camisetas (muitas mesmo) para pagar
passagens, não só minhas, mas para ajudar outros atletas também.
Nós vamos ao mundial
disputar com atletas de alto rendimento. Alguns vivem de luta e
praticam artes marciais diariamente. Mesmo assim, SEMPRE temos bons
resultados e basta entender um pouco de Sumo para perceber que nossa
luta é diferenciada.
Definitivamente
respeito muito nossos atletas e considero que já estão em posição
bastante digna, por lutarem em condições tão adversas e serem tão
duros na queda.
3 - “Foi sob seu
comando que o até então desacreditado time da Venezuela ficou em
sexto lugar no último mundial.”
Essa afirmação
merece uma complementação, pois na verdade, não foi só isso. Nos últimos três anos a Venezuela tem destinado pesados valores monetários e
humanos na prática do Sumo. Há notória participação do Governo
Bolivariano e o profissionalismo técnico e administrativo da
FEVESUMO – Federação Venezuelana De Sumo – comandados por Jose
Rodrigues e Abel Castro é espantoso.
Os treinos técnicos
são orientados por um experiente profissional, William Bernal, que
conduz treinos direcionados para o ganho físico específico para as
necessidades do Sumo, tal como força em curto espaço de tempo,
resistência e explosão. No meu conhecimento, já fizeram três
concentrações internacionais, duas em São Paulo e uma em Moscou,
no Centro Olímpico, com a Seleção Russa (atual bicho papão em
mundiais); e três seminários internacionais, o primeiro com os
campeões argentinos Sebastian Videla e Gabriel Wakita, o segundo
comigo e Luciana Watanabe (veja AQUI nossa impressão sobre o
seminário) e o terceiro com Giuliano Tussato.
Primeiro treino dos venezuelanos no Ginásio de Sumô do Bom Retiro, em 2012. |
Mas o principal é em
relação ao dinheiro. Seus atletas recebem bolsa do governo, não é
valor exorbitante, mas o bastante para pagar algumas contas; TODA a
despesa de passagens aéreas, alimentação e hospedagem dos atletas
e comissão técnica em competições e concentrações são pagas
pela FEVESUMO (não sei a origem desses se recursos, se de iniciativa
pública ou privada); nossas despesas em seminários e do técnico
estrangeiro, no caso o Giuliano, também são pagas por eles.
Enfim... É fácil
perceber que eles vão nos superar logo tanto em quantidade quanto em
qualidade dos atletas. Não é uma questão de derrotismo ou
pessimismo, mas o fato é que não é fácil passar a vida inteira
correndo atrás. Perdi a conta de quantas rifas e camisetas vendi; de
quantos fogem de mim com medo de que eu ofereça algo; de quantos me
bloquearam no facebook por fazer postagens insistentes sobre Sumo; de
quantos programas de TV, rádio, internet e afins tive que fazer; de
quanto dinheiro perdi... E mesmo assim estou aí, lutando e
defendendo os meus.
4 - “O Brasil sequer
apareceu na classificação final.”
É verdade. Se
considerarmos apenas o SportAccord Combat Games.
No ano passado o
Campeonato Mundial de Sumo foi cancelado por conta de dois eventos de
âmbito internacional que aconteceriam em datas muito próximas: o
World Games na cidade de Cali, Colômbia; e o SportAccord Combat
Games em São Petersburgo, Rússia.
Nossa seleção seguindo para o World Games 2013! |
O IWGA –
International World Games Association – é uma entidade formada
atualmente por 37 federações esportivas, sendo reconhecido pelo
Comitê Olímpico Internacional por compartilhar de seu ideal:
promover valores físicos e esportivos pelo bem estar da sociedade.
Quadrienal, o World Games é um dos maiores eventos
multidisciplinares, ficando atrás apenas dos Jogos Olímpicos.
A edição de 2013
aconteceu em Cali, Colômbia; e a Seleção Brasileira de Sumo foi um
dos principais destaques do evento, conquistando duas belíssimas
medalhas de prata, com Luciana Watanabe no Peso Leve e Jaqueline
Silva no Absoluto. Sagramos-nos a 5ª melhor equipe no Sumo e
contribuímos decisivamente para a 11ª colocação do Brasil no quadro geral de medalhas!
Eu fui como técnico
da equipe e fiquei muito orgulhoso do nosso desempenho! Nossos
atletas conquistaram o reconhecimento do público dentro e fora do
Dohyo! O sucesso foi tanto que estampamos capas de jornais, demos
inúmeras entrevistas e fomos convidados a fazer parte de uma
coletiva de imprensa em que compartilhamos a mesa com o então
presidente do IWGA! Para mim, foi um dos momentos mais felizes no esporte!
Janaína Silva fez o ginásio lotado tremer! Conquistou uma inédita 2ª colocação para o Brasil! |
O outro evento, o
SportAccord Combat Games é um dos eventos multidisciplinares
organizado pelo SporAccord International Federations’ Union (os
outros são o World Beach Games, World Artistic Games e o World Mind
Games). Também quadrienal – a do ano passado foi sua segunda
edição – reúne competições de âmbito mundial de federações
que organizam 15 modalidades de artes marciais, olímpicas ou não.
Imaginávamos que essa
competição, realizada em São Petersburgo, seria um sonho, pois
TODAS as despesas dos atletas (transporte aéreo, hospedagem e
alimentação) seriam pagas pelo país anfitrião. Pois bem...
Enfrentamos tantos problemas que a competição ficou mais perto de
um pesadelo. Os atletas viajaram sozinhos e a ausência de um técnico
trouxe dificuldades que iam da falta de disciplina (tivemos um atleta
que vergonhosamente abandonou a luta do segundo dia de competições
sem justificativa alguma) ao sobrecarregamento de alguns de nossos
lutadores mais experientes.
Há que se destacar,
entretanto, que esses lutadores não são fracassados. Faz-se
necessário analisar em que condições esses lutadores foram
convocados. Luciana Watanabe e Ricardo Aoyama foram convidados pela
IFS em reconhecimento ao ótimo resultado no Campeonato Mundial 2012
em Hong Kong; Mário Frabetti, pelo World Games 2013; os demais
lutadores foram convocados pela Federação Sul-americana pela
vitória conquistada no Campeonato Sul-americano 2013 realizado em
Buenos Aires (foram convocados apenas o primeiro colocado em cada
categoria!), no qual o Brasil venceu em praticamente TODAS as
categorias tanto do masculino como do feminino (perdemos apenas no
peso médio feminino).
Como havíamos tomado
para nós praticamente todas as vagas do continente sul-americano
para o Combat Games, a IFS escolheu Sebastian Videla (ARG) e Maria
Cedeño (VEN), por conta dos ótimos resultados no World Games 2013,
para compor o grupo que representaria os países sul-americanos.
Ainda não me desce muito bem o fato de terem convocado Maria em
detrimento de Janaína, vice-campeã no absoluto no World Games...
5 - “Os feitos de
Juba como professor e treinador, porém, são recentes.”
Conheço o Giuliano
desde criança, pois somos da mesma equipe de Sumo. Seu feito como
professor e treinador não são tão recentes... Atribuo a ele,
Kioshi Shimazaki, Silvio Watanabe e a Fábio Ikemori, minha melhor
participação em mundiais, uma medalha de bronze no primeiro
Campeonato Mundial Juvenil em 1999.
Treinando sob orientação de sensei Sato e Giuliano Tussato em 1998. Eu e Yoshi estamos na direita. |
Em 1998/1999 Giuliano
voltou ao Brasil depois de encerrar sua carreira como lutador. Foi um
momento precioso para nossa equipe. Treinamos duro e bastante. E foi
graças a isso que pude presentear meu pai com uma medalha
internacional. Sou sinceramente muito grato a ele.
Seu outro feito foi introduzir Fernanda Costa ao esporte. Mais tarde,
treinando conosco, ela se tornou uma das maiores estrelas do Sumo
mundial, conquistando a medalha de ouro no Mundial de 2003.
6 - “Além da
agarração para derrubar o adversário, o sumô profissional admite
golpes poderosos dados com os punhos.”
Socos são proibidos
tanto no Sumo amador como no profissional. O que é válido entre os
profissionais é o harite, ou seja, tapa lateral.
7 - “Juba calcula
que metade deles não tenha ascendência japonesa.”
No último
Campeonato Brasileiro, percebemos que mais de 70% não tem
ascendência japonesa alguma.
8 - “Até arranjar uniforme é complicado. Eu uso o mesmo há uns dez anos. Quando consegui falar com a fornecedora de material esportivo dos atletas olímpicos do Brasil, não só me trataram mal como perguntaram se íamos levar assessoria de imprensa para o mundial. Pô, se nem uniforme a gente tinha!”
Isso é infelizmente 100% verdade. É por isso que não tenho nenhum artigo da Olympikus e fiz questão de jogar tudo o que tinha deles fora.
Em 2012, como sei que ninguém dá nada para ninguém, eu sugeri que eles nos vendessem abrigos um pouco mais barato ou até mesmo modelos com "pequenos defeitos", desses vendidos em outlets, desde que saísse mais barato que aquele que mandamos fazer. Não me importo com respostas negativas. Mas considero falta de respeito tripudiar de quem pede ajuda. Primeiro eles me questionaram o que ganhariam ao dar agasalhos para nós (repito, pedi que VENDESSEM mais barato!); e depois perguntou se estávamos levando jornalistas para cobrir o evento.
Enfim...
É isso, amigos! Um grande abraço!
Isso é infelizmente 100% verdade. É por isso que não tenho nenhum artigo da Olympikus e fiz questão de jogar tudo o que tinha deles fora.
Em 2012, como sei que ninguém dá nada para ninguém, eu sugeri que eles nos vendessem abrigos um pouco mais barato ou até mesmo modelos com "pequenos defeitos", desses vendidos em outlets, desde que saísse mais barato que aquele que mandamos fazer. Não me importo com respostas negativas. Mas considero falta de respeito tripudiar de quem pede ajuda. Primeiro eles me questionaram o que ganhariam ao dar agasalhos para nós (repito, pedi que VENDESSEM mais barato!); e depois perguntou se estávamos levando jornalistas para cobrir o evento.
Enfim...
É isso, amigos! Um grande abraço!
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